Ofereceram-me o livro do “Ensaio sobre a Cegueira”.
Gostei! Ontem, calhou ver o filme e também gostei muito!
Admirei a realização do Fernando Meirelles, que conseguiu
fazer um trabalho notável e bastante fiel ao texto de José Saramago. Compreendo
agora as lágrimas do autor do livro ao ver o filme pela primeira vez, porque
está lá tudo e penso que o filme ultrapassou o que o Saramago imaginou.
Ficam as palavras de Vítor Aguiar e Silva, que tudo
dizem:
«A cegueira é a metáfora da desumanização e da indignidade
do homem”. Com ela, irrompem os demónios e os monstros apocalípticos: a fome, a
violência, a crueldade, a bestialidade... O manicómio desactivado onde são
encerrados os cegos e os contaminados, é a metáfora dos campos da morte da
nossa excruciante memória histórica contemporânea.
A sujidade nauseabunda dos corpos, das camaratas, dos
corredores e das sentinas do manicómio e o cheiro pestilencial que envolve e
mortalmente abafa toda a cidade, são metáforas do apodrecimento do homem.
O manicómio e a cidade fantasmática, no seu horror
absoluto, são a visão sublime e grotesca da aflição, do sofrimento, da
indignidade e da loucura dos homens. Na igreja, as próprias imagens de Cristo e
dos santos têm os olhos tapados com uma venda ou com uma grossa pincelada branca,
metáforas terrificantes da ausência de Deus.
No meio, porém, desta catástrofe horrenda, no meio de
tanta miséria física e moral, de tanta dor e tanta aflição, a esperança do
homem ainda guarda sentido, alimentada por uma tenaz consciência moral, pela
capacidade espantosa de sacrifício e pela generosidade de alguns. (...)
Na única mulher que não cegou, a mulher do médico,
encontro eu a metáfora do espírito da esperança. Como um novo Moisés, ela soube
conduzir a sua tribo à sua casa. E, após a expiação, o sofrimento inumano e a
morte de muitos, os cegos começaram de novo a ver...
SE PODES OLHAR, VÊ! SE PODES VER, REPARA!
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